Conferência de Susana Estrela
|10 de Maio - 18.00h. |
Associação dos Arqueólogos Portugueses - Museu do Carmo
MESAS DO CASTELINHO (ALMODÔVAR)
UMA ALDEIA AMURALHADA NA PAISAGEM DA IDADE DO FERRO DO BAIXO ALENTEJO
Em
finais do século V a.C. é fundado, numa paisagem marcadamente interior e
de fronteira, o povoado de Mesas do Castelinho (Almodôvar, Baixo
Alentejo). Delimitado por segmentos justapostos de muralhas, o local
vem, aparentemente, romper com as antigas formas de povoamento
conhecidas para a região baixo-alentejana.
Os
dados saídos ao longo de mais de duas dezenas de anos de um projecto de
investigação e analisados no âmbito de um trabalho académico de
mestrado vêm demonstrar a existência de um aglomerado rural que pode ser
interpretado como uma aldeia, com um desenho urbano que se define, mais
do que apenas pelas suas muralhas, pelos espaços interiores que
reflectem as actividades proporcionadas pela paisagem envolvente:
exploração pecuária, agricultura, caça.
Esta
ruralidade está patente no acervo material, com consideráveis
quantidades de cerâmica produzida local ou regionalmente e, com muito
menor expressão, através da presença de artigos importados desde
paragens litorais.
No
primeiro lote incluem-se os recipientes manuais com decorações incisas,
que caracterizam o tradicional e conservador conjunto material da Idade
do Ferro da região. Dele fazem parte, porém, os inovadores recipientes
com matrizes impressas, uma das marcas definidoras da designada II Idade
do Ferro.
A
estes materiais cerâmicos associam-se artigos de origem mediterrânea,
como a cerâmica ática, as contas de vidro, a cerâmica de “tipo Kouass”,
as ânforas produzidas na baía gaditana, a cerâmica pintada em bandas,
entre outros.
O
sítio, dissimulado na paisagem e implantado numa área com fracas
aptidões naturais, na fronteira entre a serra do Caldeirão e a
peneplanície alentejana, localizado junto a uma rota de pessoas e bens,
revelará a sua importância na partilha dos artigos produzidos local ou
regionalmente e, neste particular, das cerâmicas com matrizes impressas.
Sempre muito diminutos no registo arqueológico de Mesas do Castelinho,
os artigos importados demonstram a ausência de rupturas nos circuitos da
sua distribuição pelo interior.
Estes
sinais de continuidade prolongam-se até ao século II a.C., quando o
registo material revela dos mais precoces contactos com o mundo romano
conhecidos até ao momento para a região, com uma população que mantém as
suas vivências intrinsecamente rurais, num povoado que já não utiliza a
fortificação como perímetro e que constrói novos espaços habitacionais e
de trabalho sobre as suas muralhas.
Susana Estrela